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quinta-feira, outubro 13, 2016

Irmãos Gêmeos

- Me disseram que eu tenho um irmão gêmeo.
- Você acreditou?
- Sim, por isto estou aqui.
- Quer me contar como aconteceu?
- Eu sou de Terezina no Piauí, nasci em 30 de Janeiro de 1983, na Maternidade Evangelina Rosa.
- Espera, tem certeza que precisa ser tão específico.
- O senhor é o detetive Paranhos não é.
- Sou sim.
- Pelo que eu soube o senhor é o melhor da região e me foi muito bem recomendado.
- É, modéstia à parte, eu sou sim.
- Na sua placa na porta está escrito “Detetive Paranhos – Por favor ‘Seja específico’”.
- Tem razão, faz tempo que tenho que trocar esta placa, eu a coloquei porque as pessoas achavam que eu era um tipo de mágico ou prestidigitador, me davam um nome sem sobrenome para eu encontrar a pessoa sabe Deus onde.
- Por isto estou seguindo o seu conselho senhor Paranhos.
- Então continue senhor...?
- Balthazar.
- Sim claro, continue senhor Balthazar.
- Como eu dizia, eu nasci naquela maternidade há pouco mais de trinta anos, a minha mãe se chama Gertrudes de Aragão Nunes e meu pai se chama Ermelino Nunes, então sou Balthazar de Aragão Nunes. A minha história não é tão incomum sou o tipo do migrante que veio para São Paulo em busca de uma vida melhor.
- Como era a vida em Terezina?
- Bom, por ser a capital do estado e a cidade mais populosa, havia um problema crônico de espaço e a concorrência era feroz para o que quer que fosse, tanto mercadorias, mulheres, empregos, escolas e tudo o mais, era difícil lidar com isto, a temperatura geralmente é bastante alta, durante muitos anos achei que não sairia de lá, afinal eu gostava do lugar, estava completamente adaptado, mas muita coisa me incomodava.
- O que, por exemplo?
- Bem, meus vizinhos eram excêntricos, dados a festas que viravam a madrugada, a minha incompetência no aprendizado que acabou se mostrando como apenas um tipo de bloqueio, pois aqui em São Paulo consegui lidar muito bem com os estudos, mas antes eu achava que não iria muito longe estudando por lá.
- Entendo, talvez fosse apenas uma questão de desafio.
- Pode ser, mas acho que era mais a curiosidade de conhecer a maior cidade do país, sempre tive curiosidade sobre São Paulo, desde que me entendo por gente, acho que sempre senti uma atração por estas terras, como se eu tivesse nascido aqui, entende?
- Sim, claro, vários dos meus clientes costumam dizer o mesmo, mas continue.
- Então, eu tinha 15 anos quando pensei em ser arquiteto, sabia que a profissão era dura, pois a não ser pelo Oscar Niemeyer, poucas pessoas haviam se dado bem no Brasil nesta profissão principalmente em Teresina, isto seria também um bom motivo para vir para cá.
- Têm parentes aqui?
- Não, mas agora começo a achar que sim.
- Por quê?
- Por causa do episódio da rodoviária.
- O que houve na rodoviária senhor Balthazar?
- Eu tinha acabado de chegar a São Paulo voltando de uma viagem a Terezina, tinha ido visitar a minha mãe, deve fazer uns dois anos que isto aconteceu e de repente fui abraçado por um estranho e ele disse com muita intimidade:
“- Leônidas, que saudades de você, como você mudou, também, deve fazer uns 10 anos que não o vejo, como está jovem, não envelheceu nenhum dia. - Me desculpe senhor, de que nome me chamou?
- Leônidas, seu brincalhão, não me diga que não se lembra de seu velho amigo?
- Olha, o senhor está me confundindo, não conheço nenhum Leônidas, meu nome é Balthazar, não sei como pode ter me confundido, mas não posso ajudá-lo.”
- Eu já estava saindo e me distanciando quando aquele senhor correu atrás de mim me pegou pelo braço e disse:
“...- Não é possível, você é o Leônidas ou você é irmão gêmeo dele, tem os mesmos olhos, o mesmo nariz, se eu tivesse uma foto mostraria a você, mas não pode haver outra pessoa tão parecida assim.
- Meu senhor, vou te provar que não sou o Leônidas.”
- Mostrei a identidade a ele e disse que trabalhava em São Paulo há muitos anos e que as únicas cidades que conhecia eram Terezina minha cidade natal e São Paulo onde estava trabalhando hoje, mas ele insistia que me conhecia de Goiânia.
- Entendi, por isto veio me procurar, quer achar o seu irmão gêmeo.
- Na verdade ele pode ser apenas um sósia.
- É uma possibilidade, mas pela descrição detalhada do sujeito, a possibilidade de vocês serem irmãos é grande. Vou começar a investigação, preciso do endereço da clínica de seu nascimento, toda a sua documentação e se puder a de seus pais, também vou mandar alguém a Goiânia para ver se encontram alguém parecido com você, então também precisarei de uma foto em tamanho de pôster se possível.
- Por favor senhor Paranhos, faça isto com discrição, não quero meu rosto nos jornais de Goiânia, eu não sei o que o meu suposto irmão faz ou fez, não quero me arriscar à toa.
- Entendo a sua preocupação, senhor Balthazar, pode confiar, realizarei um bom trabalho e o manterei informado.
- Obrigado senhor Paranhos.
- Como deve saber, estou a serviço do senhor Oscar.
- Claro, eu jamais poderia pagá-lo.
- Então terei que notificá-lo das minhas descobertas.
- Não há problemas senhor Paranhos, o senhor Oscar quer muito me ajudar e pode contar tudo o que descobrir para ele também. Quando começa?
- Terei que fazer alguns telefonemas, agendar os voos, contratar um pessoal e assim que me trouxer a documentação vou para campo investigar.
- Então estamos acordados.
Depois disso voltei à pensão Tordilhos, onde tenho morado nos últimos anos:
- Telefone para você, senhor Balthazar.
- Obrigado senhora Helga, já vou descer para atender.
Ainda preciso usar os telefones fixos:
- Alô, aqui é o Balthazar.
- Oi Balthazar, sou eu.
- Oi linda, finalmente você ligou.
- Como é que pode, eu devo ser a única mulher cujo namorado, não tem celular.
- Graziela, eu estou trabalhando nisso, em breve, eu vou ter um, mas sabe como é a vida de mordomo, não é tão rentável assim.
- Balthazar ou você é pão duro demais ou tem medo de tecnologia, até os carrinheiros têm celular...Bom deixa prá lá, como foi com o investigador?
- Ele pareceu um sujeito interessante e muito competente vamos ver o que ele é capaz de fazer, não dá para analisar sem ver os resultados né, você vai passar aqui hoje ou quer que a pegue no serviço?
- Você está de folga?
- O senhor Oscar disse que depois de tanta dedicação eu merecia uma semana de folga.
- Faça o seguinte, eu vou sair em meia hora, venha aqui, vamos sair para jantar ou fazer alguma outra coisa.
- Certo logo mais nos encontramos então.
Ao desligar o telefone, eu ouvi um comentário da senhora Helga:
- Já ouviu falar em telefone celular, senhor Balthazar?
- Dona Helga, obrigado pela dica. – Respondi de modo sarcástico.
Ainda ouvi comentário quase silencioso de Dona Helga:
- O cara parece o tio Patinhas.
Mas a este não quis responder, combinei de encontrar a Grazi no Bar Guantânamo:
- Balthazar, vai me contar o que realmente aconteceu?
- Sobre o que, Grazi?
- Você trabalha há 3 anos para este tal de Oscar e ele nunca foi de te dar nem bom dia, de repente você ganha uma semana de folga, o sujeito contrata um detetive para você encontrar alguém que você nem sabe se existe.
- Grazi, meu bem, para começar a história é muito séria, o sujeito que me abordou na rodoviária, ficou muito desnorteado quando percebeu que eu não era o tal Leônidas.
- Certo já ouvi esta história mil vezes.
- Quanto ao senhor Oscar aconteceu o seguinte, como você sabe sou formado em arquitetura.
- De novo você é único, Balthazar.
- Como assim?
- O único arquiteto que trabalho de mordomo.
- Sabe Grazi, às vezes me pergunto por que eu namoro você.
- Porque eu sou linda, paciente, compreensiva e estou sempre te incentivando.
- Claro, claro, só pode ser por isto, quer ouvir a minha história?
- Vamos lá.
- A pouco tempo o senhor Oscar estava com dificuldades de terminar um trabalho que iria render muito dinheiro tanto para empresa quanto para ele mesmo, mas não conseguia terminar, já fazia três dias que estava travado com alguns cálculos, como deve saber a matemática é uma ciência exata. - Se você não fala, eu nunca ia saber.
- Grazi, como você não se tornou humorista?
- Sei lá, falta de oportunidade.
- Então, fui servir um café para ele e notei em uma rápida olhada que o cálculo inicial estava errado, então:
“- Senhor Oscar.
- Diga Balthazar.
- Acho que o senhor se equivocou neste primeiro cálculo.
- A raiz quadrada de 125?
- Sim, na verdade é 11,18 e não 25, pois 25 é a raiz quadrada de 625.
- Nossa...- conferindo -...tem razão. Fiquei tão entretido em cálculos de fórmulas que esqueci a matemática básica, esta história de fazer conta de cabeça sempre me levou a erro, perdi de tirar vários 10 em matemática por causa desta bobeira. Como consegue guardar estes números na cabeça?
- Quando se é formado em arquitetura e não se exerce a profissão, isto se torna um hobby.”
- Assim você caiu nas graças do patrão.
- Ele até me deu uma grana por causa do grande contrato que conseguiu fechar.
- E tudo por causa de uma raiz quadrada.
- Sim.
- Talvez agora você possa comprar um celular.
- Apesar de achar que não é necessário, desta vez você tem razão. - Aleluia, finalmente, mas o que fez você mudar de ideia?
- Acredito que com um investigador trabalhando para mim é bom que ele tenha contato direto comigo.
- Finalmente usou a cabeça Balthazar, talvez você não seja tão leso quanto imaginei.
- Apesar do insulto vou tomar como um elogio, minha linda namorada.
- Não fique acomodado, se você se mostrar interessado, talvez o senhor Oscar te dê uma oportunidade de trabalhar com ele no ramo da arquitetura. - Não estou tão confiante como você, mas acho que pode ter razão.
- Eu sempre tenho razão, você é que nunca me escuta.


Continua