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sexta-feira, dezembro 28, 2007

DIA DIFÍCIL

"Ô vida dura" pensava Marcelo novamente apertado feito sardinha no seu costumeiro ônibus a caminho de casa, eram altas horas da noite, mas era o “rush” noturno todas as faculdades saíam na mesma hora, o que deixava Marcelo desanimado, todos os dias acordando cedo e indo dormir tarde da noite (algumas vezes de madrugada), nesta noite especificamente, algo incomum estava para acontecer. No meio do caminho havia uma viatura. O policial adentra ao coletivo e prolata:
- Todos os homens, para fora!
Como ninguém é besta de contrariar o policial, todos saem, Marcelo é o primeiro a ser revistado, o policial faz as perguntas de rotina:
- De onde você está vindo?
- Da faculdade, senhor.
- Agora, todo vagabundo deu para dizer que é estudante.
- Ué, por que o senhor não acredita em mim?
- Escuta aqui negão, eu estou cansado de ouvir justificativas sem nexo de pilantras que nem você, estou o dia inteiro nessa merda procurando uns vagabundos que assaltaram um banco e segundo as pistas vão passar por esta avenida, como fugiram a pé, tenho que parar todos os coletivos para ter certeza que não estão aqui.
- Pois é, sinto muito que o senhor esteja cansado, mas caso não tenha percebido, não o único por aqui, toda esta gente está cansada de trabalhar, de estudar e de agüentar gente cansada que nem você interrogando a gente.
- Tá me desafiando crioulo, to doidinho para dar uns murros em alguém e é só você me dar motivo.
- Ô Almeida, pega leve, o rapaz é estudante, não fica incomodando ele não.
- Tá com sorte, crioulo.
Mais adiante, um policial se desculpa com um homem trajando um terno Armani:
- Perdoa-me senhor, não sabia que o senhor era juiz, pode voltar para o ônibus, mas desculpa a minha curiosidade, o que houve com o seu carro?
- Tive um acidente há pouco tempo, ainda não voltou da oficina, na verdade vou pegá-lo amanhã.
- Tudo bem e desculpa mais uma vez.
Marcelo vendo aquela cena, não entende, a forma de agir da polícia, mas infelizmente, se conforma, vivemos num país racista, não só de cor, mas de classe e até, pasmem, de roupas.
Terminada a batida, o ônibus segue viagem, e a poucos pontos do final onde Marcelo desceria e teria o descanso dos justos. Um homem de terno se levanta e dá voz de assalto:
- Cobrador, não perca tempo e encha este saco de dinheiro. Vamos lá pessoal, não tenho a noite toda, podem passar relógios, dinheiro e tudo o que tiverem nas bolsas e carteiras ou então a magnum vai começar a soltar azeitonas.
Feita a coleta, o magnata desce do ônibus, diante da perplexidade de todos:
- Mas, esse aí não era o juiz, que o policial não revistou?
- Era sim, infelizmente, justo onde não procuraram é que havia o que apreender.
E o ônibus segue viagem, mas no outro ponto, o motor arria e todos os cento e vinte passageiros têm que sair e esperar no sereno para que o ônibus reserva apareça. Como a tecnologia é boa nestas horas. O celular de Marcelo toca:
- Oi amor, onde você está.
- Oi, Regina, o ônibus quebrou, estou a poucos quilômetros de casa, não fosse a penumbra seguiria a pé, devo chegar em 15 minutos.
- Tudo bem, vou estar esperando.
Ao desligar o celular Marcelo avista o coletivo reserva que rapidamente é preenchido e segue viagem.

Ao desligar o telefone Regina diz:
- Ainda bem, que aquele corno se atrasou, assim você pode ir sossegado, Rui.
- Regina, quando você vai abandoná-lo.
- Eu, nunca, enquanto você for um Zé Ruela, sem eira, nem beira, não posso fingir que vou ser feliz com você.
- Pô, não precisa humilhar também, só porque o negão faz faculdade.
- Não, Rui, é porque o negão trabalha e muito para me dar a vida boa que tenho, coisa que você nem pensa em fazer e melhor você ir embora antes que ele chegue.
Rui ainda dá muitos amassos em Regina esquece-se da hora até ser tarde demais. Marcelo abre a porta e dá de cara com Rui:
- Quem é este sujeito, Regina?
- É, é um primo meu, ele veio fazer uma visitinha.
- À meia-noite?
- Mas não se preocupe ele está de saída.
- Não, não está não, agora quero saber direitinho esta história, tá na minha casa porque ô rapa?
- Ela já não te disse, eu sou primo dela.
- Ah é, então de qual tia dela tu é filho?
- Bem, da...da...da...
- Da tia Zilu completa Regina.
- Tia Zilú em, e quantos anos tem a tia Zilú, cara?
- Ahn, 62?
- Você tá morto!
A confusão adentra a madrugada, os vizinhos acordam para ver a coça que Marcelo dá no seu, como direi, folguista. Muito sangue, suor e lágrimas depois. Marcelo arruma suas coisas e vai embora, Rui meio morto ainda enxerga Regina vindo em sua direção:
- Viu o que você arrumou, agora já era. Fui.
No outro dia, Marcelo compra um jornal cuja notícia da capa é interessante:
“Policial racista é morto por um branco”, a matéria dava conta de que após o policial chamar uma negra de “macaca suja” seu marido indignado se apoderou da arma do policial e deu cinco tiros na sua face, preso em flagrante o senhor declarou em alto e bom som “faria de novo” disse isto e cuspiu no cadáver do sujeito. Para a surpresa de Marcelo, o policial era o mesmo que o abordara no ônibus na noite anterior.

Nota do autor: Que fique claro que isto é apenas uma estória, não estou de maneira alguma fazendo apologia a mortes por vingança, ou a racismos exacerbados, só estou contando a verdade sobre o que o ser humano é capaz de fazer, se acuado. E que quem vive perigosamente tem mais chances de encontrar a morte.

2 comentários:

Anônimo disse...

Olá Hugão, passei só para fazer um comentário... então, tá comentado. abrax
Nei

Keyser Soze disse...

falou, mas seria melhor se vc comentasse o texto, se ficou bom, se ficou ruim, alguma lacuna, se gostou ou não, coisas assim
Hugo