Total de visualizações de página

sábado, dezembro 10, 2011

Trinta Segundos

- Pronto.
- Graziela, a partir de agora você tem 30 segundos para dar uma resposta, depois disso, você nunca mais vai ouvir falar de mim, esta é a sua última chance. Vem comigo?
- Para onde você quer ir, Júlio?
- Você sabe do que eu estou falando.
- Eu sei.
- O relógio está correndo.
Como a situação chegou a este ponto. Quinze anos antes:
- Graziela, deixa eu te apresentar, este aqui é o Júlio.
- Como vai, Júlio.
- Como vai, Graziela. É um imenso prazer conhecê-la. Aliás, tudo aqui é tão bonito, acho que vou me adaptar muito bem nesta nova casa.
- Certo, Júlio e quanto você realmente tem para podermos negociar?
- Na verdade Graziela, vou ter que fazer um financiamento, mas tenho certeza que poderei pegar cerca de 200 mil reais.
- Cláudia, deixa que eu cuido deste cliente.
- Eu tinha certeza que você poderia resolver isto, até depois.
- Como você mesmo disse, Júlio, esta casa é muito bonita, tem um jardim pequeno, mas o espaço é amplo, está situado em local de fácil acesso a mercados, farmácias, shoppings e tudo o que um pessoa precisa para não se incomodar com as necessidades mais urgentes. O senhor tem carro?
- Não tenho não.
- Vejo que não usa aliança, também não é casado?
- Olha Graziela, assim como todas as pessoas, sonho em me casar, mas por motivos que prefiro não explicitar, nunca deu certo para mim; quem sabe mais tarde se conseguirmos firmar uma amizade, talvez possamos falar a este respeito numa outra ocasião.
- Certo, Júlio, mas o interesse é porque esta casa é muito grande para uma só pessoa, pretende trazer familiares para morar com você?
- Não, Graziela, é só para mim mesmo.
- Entendo. Bem, então vamos ver os cômodos.
- Claro.
Logo:
- Então, Júlio, aprovado?
- Por mim, está ótimo. O preço é este do anúncio, cento e cinquenta mil reais, certo?
- Exatamente.
- Será que o proprietário baixa um pouco o valor?
- Sim, até quatro mil, talvez. Faça a sua proposta e verei o que posso fazer.
Quinze dias mais tarde:
- Pronto.
- Oi Graziela. É o Júlio, tudo bem?
- Júlio de onde?
- Eu sou aquele cara que queria comprar aquela casa da fonte.
- Ah sim, senhor Júlio e então foi aprovado o financiamento?
- Na verdade não, Graziela, mas não é por isto que eu liguei.
- Não foi por isto que ligou? Porque ligou então?
- Não sei como te dizer isto, mas gostaria de sair uma hora destas para almoçar, jantar ou até mesmo tomar um café?
Após a pergunta, poderia se ouvir um alfinete caindo na sala em que Graziela se encontrava ou uma sinfonia de grilos ao fundo do telefone. Após se recuperar do susto:
- Júlio, desculpe, não me lembro muito bem de você. Você está me convidando para sair?
- Não me diga que é a sua primeira vez.
- Não, é claro que não, só é a mais inusitada. Olha, também não sei como te dizer isto, mas sou casada, então acho que não vai dar.
- Casada? Não vi aliança na sua mão.
- Esta eu posso explicar, estudos do pessoal do marketing dizem que as pessoas que não usam aliança têm maior potencial de venda, além do mais, não é exatamente um casamento de papel passado, como dizem os antigos, mas estamos juntos há 10 anos, considero um casamento. Espero que não tenha ficado chateado.
- Não, Graziela, de forma alguma, obrigado pela sinceridade.
Um mês depois:
- Ei garçom, por gentileza, traz para mim uma picanha grelhada.
- Pois não, senhor Júlio. - O garçom chega a sair, mas retorna e diz - Não sei se notou, senhor Júlio, mas tem uma moça que está olhando para o senhor desde que o senhor entrou no restaurante.
- Na verdade notei sim, Aldo. Mas ainda não sei quem ela é. Sabe, eu tenho dificuldade com gente nova.
- Se quiser, ofereço um champanhe a ela, com os seus cumprimentos.
- Faça isto Aldo, acho uma excelente idéia.
Feito isto, a moça levanta-se e vai em direção a mesa de Júlio:
- Você não me reconhece?
- Deveria?
- Incrível, como você pôde se esquecer tão fácilmente de mim. Há um mês, você me deixou numa situação embaraçosa ao me convidar para sair pelo telefone após, praticamente, ter acabado de me conhecer.
- Graziela, é você? O que você está fazendo aqui?
- Tem razão, não é um lugar que costumo frequentar, obrigada pelo champanhe.
- Você merece. Quer me contar alguma coisa?
- Você deve se lembrar do meu "marido" - faz sinal com dois dedos de cada mão.
- Claro que sim. Aconteceu alguma coisa com ele?
- Acho que não. Na verdade aconteceu comigo.
- Certo, o que houve?
- Acho que nossa relação está falida, mas não tenho coragem de dizer isto a ele, estávamos levando isto em banho-maria, mas aí, ele começou a pousar fora de casa, depois de um tempo, eu comecei a pousar fora de casa.
- Naquele dia que eu te liguei, vocês já estavam em crise, certo?
- Sim, por isto, fiquei tão surpresa com o seu convite, mas tive medo de você porque, na verdade, estes assédios no serviço ocorrem com mais frequência do que imagina.
- Você ainda não me conhece. Como sabe que sou uma pessoa boa?
- Alguém que vem a um restaurante, conhece o garçom pelo nome, oferece um champanhe a uma desconhecida, por assim dizer, em vez de mandar recados, é, no mínimo, uma pessoa atenciosa. O seu jeito de falar no telefone me desmontou também "Eu não sei como te dizer isto..." - boas gargalhadas depois da imitação.
- Não entendi uma coisa, porque veio a um restaurante em vez de ir a um bar?
- Não sei dizer, senti vontade de comer uma boa comida. Lá em casa até os jantares andam estranhos, achei melhor comer bem em vez de me encher de álcool.
- É que geralmente as pessoas afogam as mágoas em bares.
- Por incrível que pareça, não há mágoas a serem afogadas, acho que só me acostumei com o Fabrício.
- Este o nome é do seu, como direi, noivo.
Novas gargalhadas:
- Taí, esta eu nunca tinha ouvido, mas parece muito apropriado, noivo é a palavra certa, mas acho que isto nunca vai dar certo.
- Então, você parecia muito convicta ao dizer que era casada, está disposta a iniciar uma nova relação.
- Está me convidando?
- Eu estou avulso.
- Avulso?
- Sim, o que vier é lucro.
- Agora, você pegou pesado, que tipo de mulher você acha que eu sou.
- Olha Graziela, sinto que tenha te ofendido, mas não sei explicar, eu não te reconheci porque você estava triste e de cabeça baixa, quando você chegou a minha mesa, fiz um teatro para disfarçar, no entanto tenho certeza que você é a mulher da minha vida, percebi no momento em que a vi.
Novo silêncio e após minutos intermináveis:
- Eu não sei o que dizer. Eu não sinto nada por você, estou apenas carente, mas acho que ninguém nunca me disse isto antes, o que torna a situação mais difícil ainda. Acho que posso te dar meu telefone, mas não posso fazer mais nada além disto. Logo após escreve no guardanapo o telefone e o nome Graziela com um G gótico e sai transtornada.



Continua

Nenhum comentário: