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sexta-feira, maio 05, 2006

Vidas Conectadas

Joana acorda atrasada como sempre, em desespero, escova os dentes muito rapidamente, passa uma escova no cabelo, veste a calça que teima em não entrar, mas deita-se na cama e com muito custo consegue fechá-la, deixando o quadril a ponto de estourar. O telefone toca:
- Alô.
- Joana, você ainda está em casa, esqueceu a reunião?
- Não, Selma, eu apenas acordei atrasada, ontem a noite foi comprida.
- É eu acredito, mas é melhor você vir logo, eu já estou sem desculpas para justificar a sua ausência.
- Não se preocupe estarei aí em alguns minutos.
Selma e Joana se conheceram na Faculdade de Administração; eram amigas há tanto tempo que, às vezes, nem se lembravam de que haviam passado a infância e quase toda a adolescência separadas, mas a vida pacata das duas estava para mudar, neste mesmo dia, na reunião da manhã, elas conheceriam Sandra e Portia, as mulheres que tornariam o dia das duas muito comprido.
- Bom dia pessoal, desculpe o atraso.
Todos ficam em silêncio, menos Selma:
- Bom dia, Joana.
Sandra começa uma explanação a respeito da próxima estratégia de marketing da empresa, apesar da idéia ser muito boa, a prolixidade da oradora deixa todos com sono.
Mais tarde no escritório da Selma:
- Ei Joana, o que há com você, será que nunca vai parar de se atrasar?
- Ué, virou minha chefa agora.
- Não é nada disso, é que essa nova gerente de marketing, está no meu pé e eu acho que será uma questão de tempo para ela também estar no seu.
- Você está falando da Sandra?
- É a Sandra e a sua assistente a Portia.
- Mas o que foi que eu perdi? Quando saímos ontem para ir embora, estas duas não estavam aqui.
- Nem me fale o Gerente geral conheceu essas meninas num happy hour a dois quilômetros daqui.
- Nossa nunca ouvi falar de recrutamento em bar.
- Eu não duvido de mais nada.
- Por outro lado, esta Sandra parece ter uma boa formação.
- É acho que ela entende do assunto.
No escritório do Diretor Geral:
- Sandra, você realmente confia que isto vai dar certo?
- É claro, senhor Almeida, esta estratégia já deu certo em muitas empresas da Europa, apesar de os consumidores terem hábitos diferentes dos europeus, algumas pequenas adaptações farão com que o plano funcione.
- Tudo bem, vou te dar um voto de confiança.
Portia não era dessas mulheres que falam muito, principalmente se não entendesse do assunto, mas quando dominava o tema, ninguém a segurava:
- Sandra, não acha que essas diretoras estão pouco receptivas a nós?
- Percebeu também, né?
- Que tal se a gente tentasse uma aproximação?
- Como?
- Poderíamos convidá-las para jantar.
- É, não é má idéia.
Algum tempo depois:
- Jantar, hoje, não sei, é tão inesperado.
- Já tem compromisso, Selma?
- Não, não é isso, só estou surpresa, mas eu vou sim, vou falar com a Joana, ver o que ela acha, mas provavelmente iremos sim.
Logo:
- O que será que elas estão tramando Selma? Jantar assim sem mais nem menos.
- Não vejo nada de mais. Apenas querem se enturmar.
- Tudo bem, eu vou, mas escreva isto em, elas estão armando alguma.
- Deixa de ser tão desconfiada amiga, foi praticamente assim que nos conhecemos, em uma saída da turma de administração.
Tudo combinado, elas vão a um restaurante italiano comer uma massa:
- Portia de onde você é? - Pergunta Selma.
- Meus pais eram da Austrália, nunca soube o motivo de terem saído de lá, mas eu sou Fluminense de Nova Friburgo e você Selma, de onde é?
- Eu sou de Curitiba.
- Você não parece ser de lá, as pessoas são muito fechadas nesta cidade.
- É eu sei, tive que aprender a me libertar da timidez, sabe como é no nosso ramo não há espaço para acanhamentos. E você Sandra de onde é?
- Eu sou de Campina Grande na Paraíba.
- Ué, e cadê o seu sotaque?
- Depois de anos vivendo em São Paulo é difícil manter as origens, agora só falta a Joana.
- Eu sou Gaúcha de Cruz Alta, é uma região bem fria do Sul do Rio Grande do Sul, algumas vezes vou pra lá, tenho umas tias que são freiras e que moram lá.
Selma comenta:
- Nossa tem gente de todo canto nesta cidade de São Paulo, daqui a algum tempo não haverá mais paulistanos em suas ruas.
- Tem razão.
- Eu tenho uma dúvida. - diz Joana - É verdade que vocês foram recrutadas num happy hour?
- É verdade sim. - Responde Portia - Eu estava com Sandra tomando um coquetel e comentando sobre as propagandas do prêmio profissionais do ano e comentando sobre as possíveis modificações que seriam mais eficientes para a venda do produto. E nisso apareceu o Almeida que quis participar da conversa, como éramos apenas free-lancers, vimos uma oportunidade de crescer profissionalmente no momento em que o Almeida ofereceu-nos o serviço.
- Puxa, ainda estou perplexa, é tão estranho como as coisas acontecem na nossa vida, se vocês não tivessem ido ao bar, não estaríamos hoje aqui conversando.
- É verdade, mas acho que foi pura sorte.
As meninas saem sorridentes do restaurante por se conhecerem melhor quando acontece algo inesperado. Uma van pára em frente ao restaurante e diante dos olhos perplexos dos transeuntes, as quatro mulheres são jogadas pra dentro da van e levados para um local desconhecido, amordaçadas e amarradas e também com capuzes, ficam incapazes de dizer para onde estão sendo levadas. Mas conseguem ouvir a seguinte conversa:
- Tem certeza que as donas são essas?
- Claro que sim, olha aqui as fotos, são elas mesmas, agora vamos para o local combinado.
Chegando ao local, as quatro são colocadas no chão, ouvem alguém falar em japonês algo incompreensível, depois um dos capuzes é arrancado é o de Portia:
- Não deve estar se lembrando de mim Portia.
- E deveria? Quem é você?
- Eu sou Oruo Matsumora.
- Fiquei na mesma.
- Claro talvez você não se lembre, mas com certeza seu pai se lembrará e isto é o que importa.
- O que você tem com o meu pai?
- O seu pai me deve dinheiro senhorita Portia e eu sou um homem de negócios, não posso deixar que me logrem, não sabe o quanto foi difícil achar vocês, desde que saíram da Austrália foram mais de trinta anos procurando este caloteiro.
- Hum, meu pai deve dinheiro pra você e de quanto estamos falando?
- 6 milhões de dólares.
- Tudo bem o problema é comigo, porque elas estão aqui?
- Em parte por estarem com você, mas a verdade é que sem vocês quatro a empresa Carvalhaes não funcionará.
- E daí?
- Parece que o seu pai não conversa muito com você, não é? E daí que o sócio do seu pai, o Carvalhaes, o ajudará a pagar o seqüestro entendeu agora?
- Sim, mas porque você ainda está conversando comigo e não ligou pro meu pai, para resolver logo este negócio?
- Farei isto, não se preocupe.
Muito choro e ranger de dentes depois, o Senhor Matsumora liga para o seu devedor Alfredo, ele atende ao telefone nervoso:
- Alô.
- Senhor Alfredo, há quanto tempo.
- Quem fala?
- Tem certeza que não sabe Alfredo, duvido que a minha voz tenha mudado tanto.
- Oruo, como conseguiu este telefone?
- Não importa cara, eu estou com alguém que é muito importante para você.
- É mesmo e quem seria?
- A sua querida filha.
No cativeiro:
- Portia, quem é essa gente? - Indaga Selma.
- Sei lá, parece coisa do meu pai, nem sabia que ele tinha sociedade com o senhor Carvalhaes.
- Talvez isto explique o recrutamento no bar.
- Sim, mas o mais interessante é que não vejo o meu pai há quase 15 anos, não tenho certeza se ele virá para nos salvar.
- Portia, ele precisa vir, eu preciso tomar algumas providências para organizar a festa de final de ano da empresa, e amanhã eu tenho uma viagem marcada com o meu namorado. Diz Joana.
- Supondo que você sobreviva Joana, acho que terá tempo de resolver isto mais tarde.
Oruo ainda conversa com Alfredo:
- Como vou saber que está com ela?
- Aguarde um minuto.
- Alô pai, por onde andou nos últimos quinze anos?
- Pelo que eu saiba, você é que fugiu de casa.
- Tudo bem, mas não precisava ter mudado, sem avisar ninguém, não é?
- Chega de papo. - diz o seqüestrador. - A duas horas da manhã em frente ao Masp, leve os seis milhões.
- Oruo, seja razoável, onde vou arrumar 6 milhões de dólares, em quatro horas, parece que é doido.
- Fale com o seu amigo Carvalhaes, acho que ele saberá o que fazer; não se atrase!
Alfredo está perdido, não sabe se liga pra polícia, para o amigo Carvalhaes, ou se assalta um banco, em apenas quatro horas, não há mais tempo, a decisão precisa ser tomada e resolve ligar para o Carvalhaes.
No cativeiro:
- Sandra o que você está fazendo? - Pergunta Joana.
- Bem, pode ser uma surpresa para você já que não me conhece direito, mas eu aprendi a desfazer nós de corda com um professor de Kung Fu que tive na minha adolescência. - Diz isso e mostra as mãos livres em sinal de triunfo. Logo todas estão livres:
- E agora qual é o plano? - pergunta Selma à Portia.
- E eu sei lá. Nunca fui seqüestrada.
Joana se manifesta:
- Como eu gosto muito de filmes de ação, tenho uma solução hollywoodiana. Sandra e Selma, ficam de um lado da porta, eu e Portia ficamos do outro, quando o seqüestrador vier pulamos em cima dele e o desarmamos.
- Só para registro, não me parece uma boa idéia. - Diz Sandra.
Joana responde:
- Tem uma idéia melhor?
- Não.
- Então preparem-se, vem vindo gente aí.
Alfredo liga para o Carvalhaes:
- Alo amigo estou numa enrascada.
- É eu sei, seqüestraram a alta diretoria da minha empresa e entre elas a sua filha.
- Como sabe disso?
- O tal de Oruo diz que conhece você lá da Austrália.
- Bem, já que está a par da situação, me responde você tem como conseguir 6 milhões de dólares?
- Não, é impossível, não que não tenha o dinheiro, mas o problema é o horário.
- E o que vamos fazer?
- Ainda não sei, mas precisamos de uma solução rápida.
- Devíamos chamar a polícia.
- Com certeza, mas arriscaríamos a vida de todas elas.
O seqüestrador abre a porta e uma avalanche de cabelos, unhadas e dentadas caem sobre ele deixando-o impotente, Sandra se apodera da arma e rende o seqüestrador. Elas saem com muito cuidado vem mais um bandido que tenta atirar nelas, elas se jogam no chão e Sandra surpreendentemente atira na mão de bandido e arranca a arma de sua mão. Ambos rendidos são amarrados e trancados no antigo cativeiro das meninas.
Enquanto isso, no MASP, no local marcado:
- Trouxe o meu dinheiro Alfredo?
- Onde estão as meninas? - Pergunta Carvalhaes.
- Ah, você também quis se juntar a nós, Carvalhaes, elas estão num lugar seguro, quando eu tiver o dinheiro, eu as libertarei.
O telefone celular de Oruo toca:
- Com licença, senhores; logo terminaremos o nosso negócio. Alô.
- Senhor Oruo, elas escaparam.
- Certo.
- O senhor não me entendeu?
- É claro que sim, não se preocupe, estou numa reunião importante, daqui a pouco conversamos sobre isso e tentaremos achar uma solução. Sayonara.
- Esse japonês! Só pode ser maluco.
Quatro mulheres correndo de madrugada no bairro Vergueiro, encontram um táxi abrem a porta entram esbaforidas acordando o motorista que diz:
- Pelo amor de Deus, eu tenho quatro filhos para criar, não me mate, pode levar o dinheiro.
Elas ficam confusas e o motorista aponta para a arma e elas sorriem:
- Não moço, não viemos assaltá-lo não, só queremos sair daqui.
- Orra meu, graças a Deus. E para onde vocês querem ir?
Cada uma diz o seu endereço e são entregues seguras em casa e o pagamento é feito por Portia, elas chegam a se recusar, mas Portia diz:
- Não fossem por mim, não teriam sido seqüestradas, é o mínimo que posso fazer.
Na Avenida Paulista:
- Sem essa de lugar seguro, sem elas, não tem acordo, adeus.
- Tudo bem, só um minuto.
Oruo faz uma ligação diz:
- Coloque elas na linha.
- Como chefe, elas fugiram.
- Faça o que eu estou dizendo, coloque elas na linha.
- Ah chefe agora entendi, são aqueles códigos, já vou colocá-las.
Oruo passa o telefone para Alfredo, ele ouve uma bagunça, uma gritaria de pedidos de socorro de vozes femininas e logo ouve Portia dizer:
"- Pague ele pai, se não ele nos matará."
- Chega. - Diz Oruo - Cadê o dinheiro?
- Está nesta maleta.
No momento em que é passado a maleta, surgem as quatro mulheres andando lado a lado indo em direção ao MASP. Oruo fica perplexo:
- Como vieram parar aqui?
- Como assim, elas não estavam com você? - Responde Carvalhaes.
As mulheres agora estão correndo agora, cada qual vai para um ponto cardeal e vão fechando o cerco em cima da quadrilha que agora é formada por quatro homens, imediatamente Oruo corre para o carro enquanto os outros três começam, a atirar, Portia se joga no chão e tenta se proteger atrás de uma lata de lixo, Sandra dá dois mortais enquanto as balas vão passando do seu lado, então ela chega perto do atirador chuta a sua arma dá um golpe no seu pescoço que com isso desmaia instantaneamente. Oruo já dentro do carro dá ordens para que o motorista arranque, o motorista obedece, enquanto ainda embasbacados Carvalhaes e Alfredo ficam deitados no chão, incapazes de se levantar por conta do tiroteio promovido pelos capangas de Oruo.
- O que está acontecendo, Carvalhaes, onde estas mulheres aprenderam a lutar assim, eu jamais imaginei que a minha filha Portia fosse tão destemida.
- Acho que depois teremos uma explicação, se conseguirmos sobreviver a esta chuva de balas.
Selma e Joana saltam sobre os atiradores e ao aterrissarem tiram as armas deles e Portia derruba os dois com golpes certeiros de caratê e os rendem, a polícia aparece e leva os três bandidos para a cadeia, depois chegam ao cativeiro e encontram os outros seqüestradores amarrados dentro do quarto onde foram deixados pelas meninas.
Alfredo ainda sem entender tenta conversar com Portia:
- Minha filha, há quanto tempo. - Diz isso e a abraça.
- Pai, que bom revê-lo.
- Quando aprendeu caratê?
- Quando fui trabalhar na interpol.
- Você trabalha na interpol?
- Sim, eu e as meninas, há muito tempo que estamos atrás da quadrilha do Oruo, tive que trabalhar disfarçadas de executiva na empresa do Carvalhaes, eu não sabia que outras agentes haviam sido designadas para o mesmo serviço, a coincidência maior foi quando fomos seqüestradas juntas, e mais interessante ainda eu não sabia nem que a Sandra era agente mesmo tendo uma amizade de anos com ela, tudo lá é muito sigiloso, depois que fomos pra casa, cada uma de nós veio atrás da quadrilha e nos encontramos novamente no meio do caminho e aí descobrimos a operação, uma pena que você tenha pagado o resgate.
- Não é bem assim.
No carro, Oruo examina o dinheiro e descobre que foi enganado, as notas de dentro eram papéis e as de fora apenas fotocópias de notas de cem dólares.
De volta a Avenida Paulista:
- Você diz que estava atrás da quadrilha do Oruo há muito tempo, mas ele fugiu.
- Bem, agora a surpresa é minha, ele não fugiu, o motorista dele trabalha para nós e ele o está levando para a delegacia mais próxima, ele está acabado.
- Foi por isso que você sumiu Portia.
- Foi pai, para que você não corresse riscos.
Oruo ainda decepcionado com a sua própria ingenuidade, de repente se vê cercado de policiais e não entende como isto ocorreu.
Pela manhã, em um café da região:
- Quem diria, Joana, você uma agente da interpol.
- Eu também jamais imaginaria isto de você Selma.
- É estamos todas surpresas, umas com as outras, mas agora temos que fazer relatórios aos nossos superiores.- Diz Portia.
- Será que nos encontraremos de novo? - Pergunta Joana.
- É difícil saber. - Responde Selma - Podemos ser designadas para missões em diferentes países, no todo, a gente trabalhou muito bem juntas, gostaria muito que repetíssemos a experiência uma hora dessas.
Todas se dão as mãos e encerram por hora a aventura das quatro agentes.

Um comentário:

Marilda Confortin disse...

Dá um belo roteiro de filme policial, Hugo.